Por Ir.Bruno Claudionor, O.Cist.*
Aos olhos de muitos, a mística
especulativa desenvolvida durante a Idade Média pelos monges em seus conventos
ou mosteiros, serviu apenas como pedra de tropeço para o crescente
desenvolvimento filosófico-teológico-dialético neste mesmo período. Se por um
lado esta concepção tem seu teor de verdade, por outro, está longe de
corresponder a toda realidade. Com efeito, se é verdade e inegável que coube
aos filósofos e teólogos dialéticos protagonizar toda atividade filosófica e teológica
medieval, porque de fato, cabia a eles tal protagonização, não menos verdade é
a importância e contribuição dada pelos místicos especulativos, seja pelos seus
próprios modos de ser, de viver, seja pelos seus escritos.
Bernardo de Claraval, nascido
no ano de1090 em Dijon, França, inseri-se nesta mística especulativa.
A fé enquanto saber seguro da
realidade divina, segundo São Bernardo, vai constituir o alicerce do trabalho
que se apresenta.
Bernardo não escreveu nenhum
tratado especificamente sobre a fé, por isso, mesmo sendo toda sua obra
considerada uma especulação mística, o que não é outra coisa senão o fruto de
sua inabalável fé, fica difícil compreender a questão da fé como saber divino,
fora daquela velha e conhecida problemática entre fé e razão que tão
profundamente animou a discussão teológico-filosófica durante toda Idade Média.
Por isso, seguindo um método de estudo, primeiro é dado ênfase ao pensamento de
São Bernardo no contexto da Idade Média, e em seguida, é feito o aprofundamento
do tema em estudo. Ciente dos nossos limites para esse trabalho e tentando
responder às questões apresentadas, esperamos ao menos mostrar a importância do
nosso estudo no alargamento e integração dos horizontes teológicos e na
pesquisa sobre São Bernardo.
Mestre por excelência da
mística, São Bernardo mesmo pertencendo ao período pré-escolástico, rejeita
completamente o método e a concepção de teologia e filosofia usados pelos
filósofos e teólogos de sua época. Enquanto monge, ele escreveu primeiro para os
“seus”. Porém, assim como suas atuações, os seus escritos, partindo de
pressupostos universais, também ultrapassaram os claustros e atingiram os mais
diversos públicos, desde o âmbito eclesial até à sociedade de um modo geral.
Mas, ao rejeitar eficientemente o método dialético racional
teológico-filosófico, qual método Bernardo usou para a construção de seu
pensamento? Quais exatamente as linhas deste pensamento capaz de dar início a
todo um movimento que se desenvolveu no curso dos séculos seguintes. À primeira vista, ao menos assim parece tanto
o método quanto o pensamento Bernardino relaciona-se com sua concepção de
filosofia, que sendo decorrente da experiência claustral, é bem clara e
diferente comparada com a dos filósofos de seu tempo. Diz ele: “A minha filosofia é conhecer Jesus, e
Jesus crucificado”. Sendo Deus para
Bernardo a própria Sabedoria, este conhecer Jesus significa, pois, conhecimento
ou amor a Sabedoria considerado indistintamente como busca da sabedoria, busca
de Deus ou amor a Deus proporcionado pela fé:
“O
que é Deus? Ele é ao mesmo tempo, comprimento, largura, altura e
profundidade... Esse comprimento, o que ele é? A eternidade, pois esta é tão
longa que não tem limites seja quanto o lugar, seja quanto ao tempo. É Deus
também largura? E essa largura, que é ela senão a caridade que se estende até o
infinito? Deus é altura e profundidade; e por essa altura deveis entender seu
poder; e por profundeza, sua sabedoria. Ó sabedoria cheia de poder que chega a
todos os recantos com força. Ó poder cheio de sabedoria que tudo dispõe com
doçura”.