“Quando se manifestou a bondade de Deus, nosso Salvador, e Seu amor aos homens, não se fixou no que de bom havíamos feito, mas teve misericórdia de nós e nos salvou” Tito 3, 4-5.
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Acompanhando os relatos contidos nas Escrituras sagradas, não é difícil a percepção de como Deus em toda história da salvação se mantém como o protagonista em iniciativas concretas, que buscam a todo custo inventar uma maneira por onde o Seu povo, por meio da reconciliação, continuasse sendo salvo.
No princípio, o chamado divino impetrado no coração do homem perfez a caminhada de fé – por meio da qual Deus se revela – rumo ao Ser supremo como o criador de todas as coisas, encontrando sua concretude no apelo interior feito um dia a Abraão, historicamente falando. É dessa figura ilustre, considerada como o pai de uma multidão de filhos por seu exemplo de fé incondicional à vontade divina, que se construíram os alicerces de um povo, marcado pelo encantamento tanto da ideia como da certeza alicerçada na confiança de um Deus supremo, onde, apoiados na esperança, marchavam rumo Àquele de quem provinha todas as coisas.
É por meio da fé que encontramos o ponto de partida compreensível da ascensão da alma a Deus, ainda que pelo mistério que a envolve, no que concerne ao âmbito espiritual/divino, para a formação das comunidades – quaisquer que sejam – congregadas por uma mesma comunhão de bens espirituais ou até mesmo materiais quando nos referimos ao esforço conjunto de bem comum; é desse passo, inerente à toda experiência religiosa no homem, que não poderia deixar de existir na história salvífica um protótipo mais perfeito que Abraão, como o foi bem mais fortemente acentuado ao povo da antiga aliança, estendendo-se também de forma singular e estreita na concepção das raízes cristãs, na qual se unem por uma mesma orientação de confiança.
É importante sublinhar que, quer no chamado interno à fé, ou ainda nos acontecimentos que giram em torno da comunidade alicerçada pela comunhão dos bens divinos, o protagonista é sempre Deus, que em tudo quer a participação de sua gente, como forma de colaborar consigo na construção do mundo.
Toda a experiência de fé na história da salvação, tal como nos faz saber as Sagradas Escrituras, foi marcada por altos e baixos, vivida entre momentos de ascensões e descidas... faz-se oportuno aqui destacar, e não é de forma alguma motivo de estranheza lembrar, que, a debilidade de um povo que por conta da dúvida em algumas situações e desânimo na caminhada teve que experimentar o vazio e o abandono, artefato da Sabedoria divina em que visou sempre o retorno do mesmo à Deus, ao se despertar na consciência a luz da verdade sobre a grandeza que emanava do alto, ao se descobrir amado e acolhido por Ele.
“... teve misericórdia de nós e nos salvou”
É nas Escrituras que constatamos a fidelidade de Deus no passado, mas esta realidade que para outros foi a força que os impulsionaram adiante, deve ser experimentada na realidade particular de cada indivíduo que o segue. Deus, outrora sempre se dirigiu a seu povo com palavras e gestos humanos, capazes de serem acolhidos e entendidos do menor ao maior na tribo, ainda que tivesse que usar pessoas pelo esforço orientador de guias experimentados e específicos tirados do meio da comunidade como uma maneira de lhes tornar clara Sua Palavra.
Quem não entende a Palavra do profeta ao dizer:
“No dia do teu nascimento, teu cordão umbilical não foi cortado; não te banharam com água para te purificar, não te untaram com sal, nem te enfaixaram.
Ninguém se inclinou sobre ti para te prestar algum piedoso cuidado. No dia em que nasceste foste exposta em meio das campinas; só havia infortúnio para ti.
Passei junto de ti e te percebi banhada em teu sangue. Eu te gritei: vive (malgrado o teu sangue), vive (malgrado o teu sangue), e eu te fiz multiplicar como a erva dos prados. Cresceste. Ficaste moça. Teus seios se formaram, veio-te o pêlo. Mas estavas nua, inteiramente nua.
Passando junto de ti, verifiquei que já havia chegado o teu tempo, o tempo dos amores. Estendi sobre ti o pano do meu manto, cobri tua nudez; depois fiz contigo uma aliança ligando-me a ti pelo juramento - oráculo do Senhor Javé - e tu me pertenceste.
Então eu te mergulhei na água para limpar o sangue de que estavas coberta, e te ungi com óleo” Ez 16, 4-9.
Embora de forma alegórica, é narrada na profecia de Ezequiel com o que se parece ou como se deu a nossa união pela aliança com Deus (que é sempre uma iniciativa Sua), Palavra puramente humana para indicar o estado em que estávamos antes do encontro.
Este mesmo texto sublinha a fidelidade de Deus em vista de seu povo, onde nas entrelinhas se nos apresenta como Sua esposa amada, embora infiel como podemos constatar a seguir:
“Eu te vesti de tecidos bordados, calcei-te com sapatos de pele de golfinho, cingi-te com um cinto de fino linho e um véu de seda.
Ornei-te de adornos: braceletes nos teus pulsos, colares em teu pescoço, um anel para o teu nariz, brincos para tuas orelhas, uma coroa magnífica para tua cabeça.
Teus ornatos eram de ouro, prata, com vestimentas de linho fino, de seda e panos bordados; teu alimento era trigo, mel e óleo. Cada vez mais bela, chegaste à dignidade real.
A reputação da tua beleza correu entre as nações, pois essa beleza era perfeita, graças ao esplendor que te havia eu preparado - oráculo do Senhor Javé.
Tu, porém, te fiaste na beleza, aproveitaste da tua fama para te prostituíres e ofereceste a tua sensualidade a todo transeunte, a quem te entregaste” Ez 16, 10-15.
É sempre a mesma experiência. Aquela de ontem é a mesma de nossos dias.
Tantas vezes Israel pecou, tantas vezes quis Deus em Sua bondade infinita reconciliar na verdade o erro cometido com o intuito de fazê-lo retornar ao seu primeiro amor; tantas vezes, se afastou o Seu povo, tantas vezes Ele criou um meio em Sua Sabedoria de reunir o que andou disperso.
“Quando se manifestou a bondade de Deus, nosso Salvador, e Seu amor aos homens, não se fixou no que de bom havíamos feito, mas teve misericórdia de nós e nos salvou” Tito 3, 4-5.
A novidade do cristianismo é sempre marcada em sua forma toda específica de ser; é a religião do homem, visto ser a mesma aquela do Verbo, a Palavra, que se encarnou e armou Sua tenda em nosso meio como ultima tentativa para poder continuar salvando, segundo o dizer do apóstolo:
“Fiz-me fraco com os fracos, a fim de ganhar os fracos. Fiz-me tudo para todos, a fim de salvar a todos” 1Cor 9, 22.
Vinde Senhor Jesus...
By Maurus
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