“Quanto
a mim, não pretendo, jamais, gloriar-me, a não ser na cruz de nosso Senhor
Jesus Cristo, pela qual o mundo está crucificado para mim e eu para o mundo” Gl
6, 14.
* * *
Entre os judeus a Cruz era bem
conhecida... tratava-se de um instrumento de suplício para os condenados da
época, uma forma de punir os malfeitores daquele tempo; diríamos hoje que seria
o resultado da sentença de pena de morte como é para alguns países ainda
existente em nossos dias. Era um instrumento que causava pavor, inibia de
alguma maneira as inclinações más contidas nas ações humanas, daquele contexto
específico, e que numa linguagem espiritual e universal era inserida também os
homens de todos os tempos, os de ontem, os de hoje e os do futuro.
É sempre a mesma realidade simbólica,
podendo ser interpretada de acordo com as múltiplas experiências do homem no
orbe. Ao mencionar o simbolismo que esta implica podemos dirigir, apontar esta
realidade para aquela propriamente dita que é a Cruz como matéria física, mas
também aquela espiritual que é vivenciada de forma mais concreta e contempla
qualquer que seja o infortúnio interior de angustia, dor e de certo modo nos
persegue, ao revelar em nós o nosso ser profundo ou quem de fato somos.
Ainda hoje a Cruz, deveras, nos
causa pavor, algo até inconsciente, indesejada e imperceptível de glória alguma, contrário a
ideia de glória que concebemos e conhecemos atrelada ao prazer palpável e até mesmo
estético daquilo que possa nos atrair os sentidos pela contemplação, admiração,
a mesma apresentada segundo os vários e grandes nomes da filosofia.
Contraposta a essa ideia, os
padres do deserto viviam e sempre instruiu os seus discípulos a não se gloriar
de nada, de forma alguma, visto que a ‘glória’ é degrau propício para a soberba
do engano sobre qualquer comparação alheia. Há, no entanto, uma única glória
para os cristãos, cantada pela Igreja, repetindo os mesmos sentimentos do apóstolo ao escrever à comunidade dos Gálatas, a qual no tempo da quaresma ressoa propício aos nossos ouvidos, e, que de certo,
revela a profundeza do mistério de nossa salvação contida na Cruz:
“Quanto a nós, devemos gloriar-nos da Cruz de nosso Senhor Jesus Cristo, que é nossa
salvação, nossa vida, nossa esperança de ressurreição e pelo qual fomos salvos e libertos”.
Na Cruz está contida toda a pessoa humana.
Dizer como o profeta que Ele, Jesus, carregou sobre si nossos males é
seguramente professar o cerne de toda a espiritualidade cristã. A glória da
Cruz é sem dúvida alguma o mérito que esta recebeu de aí ser cravado o autor da
vida, fruto do seio de uma virgem que se compreende também como sendo o
verdadeiro fruto desta árvore agora bendita.
Ora, dizer que a glória do
cristão parte desta realidade de fracasso é o mesmo que se colocar no lugar de
todo homem que de alguma forma padece de algum mal, quer físico, psicológico ou
espiritual, tal como fez Jesus, mas a partir de um olhar que contemple a si
mesmo em primeiro lugar, com toda a realidade de frustração e misérias que
serão transformadas pelas atitudes de amor e compaixão em vista do próximo.
É nossa fragilidade que é confrontada na Cruz e esta por sua vez é posta num patamar que transcende nossa realidade, puramente negativa, pela consciência positiva de pertença a uma mesma posição universal em relação aos homens de todos os tempos depois da queda, restando-nos somente a aniquilação de nosso orgulho que impede-nos de amar o outro verdadeiramente como ‘é’ de fato.
Por fim, a mística da Cruz se
compreende ainda pelo fato de ao mesmo tempo em que ela abraça toda criatura,
simbolizado pela haste horizontal, ela nos liga também ao divino, une a terra
ao céu pela haste vertical, deixando-nos o ensinamento de que nossa natureza
pode ser transformada a medida que tivermos sempre em vista essa realidade
presente em nosso dia a dia.
By
Maurus
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