"A escada para o Reino dos Céus está escondida em tua alma. Mergulha para dentro dos pecados que estão em ti mesmo e, assim, encontrarás ali uma escada pela qual poderás ascender" Isaac de Nínive.
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Obs.: Abaixo, tradução do versículo bíblico para outras línguas:

"POR ISSO A ATRAIREI, CONDUZI-LA-EI AO DESERTO E FALAR-LHE-EI AO CORAÇÃO" Oséias 2,16
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sábado, 1 de setembro de 2012

Atitude Orante por intermédio da Palavra







“Vossa Palavra é luz que ilumina meus passos, é lâmpada em meu caminho” 
Sl 118, 105.      


*   *   *

Existe uma diferença entre Palavra de Deus escrita – como um dado histórico passado – e Palavra de Deus revelada, ou seja, aquela que é confrontada com a história presente, na qual a pessoa está inserida, dando-se aí como concretização da Palavra de Deus pessoal ou comunitária à sua compreensão.
A Palavra escrita é um dado importante ao compararmos os feitos que Deus outrora realizou, numa época específica, para um povo específico, sob contexto similar ou diferente de hoje, e que nos leva a direcionar o nosso entendimento ao encarnar a mesma no aqui e  agora.
Para os antigos monges, era imprescindível e lhes bastavam por excelência o contato assíduo com a leitura sagrada, ou ‘lectio divina’, que, ruminada ao longo do tempo chegavam à compreensão por meio da abertura gradativa que se dava pela experiência pessoal no decorrer do dia, ou até mesmo dos anos, logo fossem capazes de apreender e entender a Palavra de Deus pela acolhida em seu interior; sendo assim, a Sagradas Escrituras era confrontada e se misturava com a própria vida, surtindo o efeito esperado com o alargar do espírito e o dilatar do coração.
Persuadido pelo exemplo e experiências anteriores de monges - que bem antes já viviam nos desertos - contatamos que em São Bento não fora diferente; o importante foi sempre manter o contato extenso e assíduo com as divinas Escrituras, ainda que sem muita compreensão no momento, mas certo de que feito na perseverança ia se revelando no coração o entendimento do mistério divino que consistia exclusivamente no confronto entre a leitura escrita com a realidade pessoal vivida como  garantia do desvendar das revelações de Deus.
A compreensão de Deus e o pronto cumprimento à sua vontade não se dão na estagnação, mas no movimento de ação vivida; é aí onde podemos dizer que se desdobra o grande acontecimento para onde aflui todo o sedento, a contemplação. Por meio desta, somos como que transportados a um estado de êxtase pelo entendimento - talvez até sem explicação aparente - e que não podia ter sua razão de ser, não fosse o próprio Deus em Sua atração a se revelar para quem O deseja verdadeiramente. A contemplação é o ápice de uma satisfação da alma movido por um gozo espiritual que não pode ser tocado, mas unicamente sentido. Humanamente falando, assemelha-se a um prazer, amor que contempla duas pessoas que se amam; é o grau mais alto da realização que preenche o vazio interior e onde todos almejam chegar, embora nem sempre se alcance, por conta de tantas distrações que se misturam às nossas idéias e fantasias. Contemplar é rasgar o véu que separa a criatura de seu Criador, é fazer a tão sonhada e almejada experiência de Deus, numa visão que O considere para além de nossas idéias formuladas, encontrando seu verdadeiro sentido ao se deixar ser amado por Seu amor indizível, que nos acolhe como filhos.

O maior risco de impedimento a esta experiência é o de se entregar a criações fantasiosas que deturpam a imagem verdadeira de Deus que está para além de nossa compreensão, muitas vezes limitada pela nossa má inclinação. É preciso deixar moldar-se segundo o guiar do Espírito, tornar-se como criança, ou seja, abertos e atentos para tudo o que é novo e que se desenrola como novidade a cada instante, em vista de um reino, cuja presença não se encontra estagnada, mas, que, a cada dia se nos apresenta renovada por meio da história humana.

Palavra e vida jamais devem ser compreendidas separadas, e para isso São Bento promoveu em sua regra os cuidados para que em meio aos seus, a Palavra fosse o centro de seu cotidiano, numa abertura sempre constante e dócil, visto ser Ela, a Palavra de Deus, a fonte de toda a vida, eficaz aos corações sedentos, sempre dinâmica, em paralelo com a história de todo o homem.


Ao apreendermos a Palavra pela leitura, somos como que conduzidos a uma atitude de reverência interior levando-nos à meditação e, consequentemente, à oração.
Assim, a Palavra se torna orante em nós e vamos estendendo-a ao longo dos dias, meses, anos e por toda a vida, fazendo da mesma uma só com os nossos anseios, apaziguando nossos combates internos como um antídoto que cura o mal em nós. Foi desta forma que muitos dos antigos pais do deserto se superaram ao estabelecer um contato incessante com as divinas escrituras, e de forma toda excepcional; encontravam aí, nas Escrituras Sagradas, remédio contra os espíritos do mal, para as suas tendências as mais insubordinadas. Não podíamos deixar de mencionar aqui Jesus no confronto pessoal no deserto; foi com a Palavra de Deus que ele venceu o demônio. Faz-se necessário, portanto, estabelecer constantemente um estreito contato com as Sagradas Escrituras, como nos diz o Pai Isaías: “... é não deixar ao inimigo nenhuma abertura por onde ele possa entrar no nosso coração”, ou ainda, como no dizer de outro ancião: “Quando um homem lê as Sagradas Escrituras, os demônios enchem-se de temor”.  São Lucas termina o relato das tentações nos dando uma informação importante ao dizer: “... o demônio se afastou dele até o momento oportuno”, para dizer que não cessava por aí os confrontos, era preciso está sempre atento, em outras palavras, as divinas escrituras deviam sempre permanecer no coração orante preparando o terreno para os possíveis ataques que não findariam enquanto se está neste mundo.

É conhecido o termo em relação à Palavra de Deus na boca do salmista; Ela é comparada a uma espada de dois  gumes, ou melhor, bem mais que isso... vai além do que é inimaginável. Entende-se por esse termo, que, a Palavra divina tem o poder de esquadrinhar a alma e o espírito, em outras palavras, toma o homem todo,  ao confrontá-lo com os seus males, despertando o que existe de divino em si mesmo, ao revelar-lhe os segredos mais secretos de seu interior.  Nenhuma criatura humana lhe escapa, indicando que A mesma está bem inserida na vida integral de todo ser humano.
Um relato importante para a nossa compreensão nesse sentido é o encontro de Jesus com o endemoniado na terra dos gerasenos, assim como nos descreve São Marcos em seu evangelho. Sendo o Verbo do Pai, Jesus confronta e separa como uma espada, por sua ordem, o que existe de mal e destruidor no interior daquele homem possuído. Mas é pelo desejo profundo do mesmo, confrontado com o seu mal, que ele é liberto. Assim, o desejo, a ânsia, se entrelaça com a vontade divina que nada pode fazer sem o nosso consentimento, mas também cientes de que sozinhos nada se pode fazer, abrindo espaço para a intervenção de um bem necessário que esquadrinha o homem todo.
Para os antigos pais, o caminho percorrido no deserto se dava a partir da experiência particular sob a luz da Palavra de Deus como uma fonte, de onde brotava todo o bem de suas almas sedentas, confrontada dia após dia com suas más inclinações. Sob a luz de Deus, avançavam com o desejo profundo de aí encarnarem a Palavra num confronto contínuo com a sua verdade, onde pudesse chegar através de suas atitudes à compreensão de não ser mais eles que vivessem por eles mesmos, mas o próprio Cristo, como no dizer do apóstolo.
A medida de nossa adesão à Palavra, ou inclinar do coração, será o grau da força com que ela impetrará em nós Sua eficácia e nos livrará do mal com todo poder, visto ser ela, a Palavra de Deus, a qual aborrece os demônios e os dissipa. O encarnar da Palavra como forma de orientar toda ação humana se torna por assim dizer a mesma em ato e prece, uma vez que a vigilância a que Jesus nos propõe é a mesma das boas obras e que São Bento menciona já no prólogo de sua regra.
O vigiar a que Jesus se refere e São Bento enfoca em sua regra está todo voltado para aquela caridade perfeita que deve imperar na comunidade fundada sob o signo do Verbo, Palavra de Deus que se fez carne, e que poderá ser identificada como cerne de toda a busca – por meio da vivência como que encarnada da mesma – ao considerarmos o fruto de nossas ações.  




By Maurus
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* Do livro: Inclina o Ouvido do Coração - obediência segundo São Bento para os dias atuais.


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